Juan Navarro, mestre cervejeiro da marca ecológica na sua fábrica em Valência, revela ao ABC os segredos e mitos em torno da bebida indispensável para os espanhóis no verão.
Embora o seu cartão de visita diga «diretor da fábrica de cerveja» da Heineken Espanha em Valência, Juan Navarro não se cansa de se orgulhar de também fazer parte da equipa que cuida do coração invisível da fábrica: «os serviços comunitários». «Não é a parte mais romântica da produção de cerveja, mas é essencial para que tudo funcione. Controla-se o ar, trata-se a água… Se o compressor para, a embalagem para, eu paro e tudo para», resume. A partir disso e da sua experiência na produção, este biólogo de formação conquistou um lugar de destaque para contar como é produzida e apreciada a bebida mais popular do verão… e do inverno.
A sua paixão pela cerveja despertou durante a sua formação de mestrado na Associação Espanhola de Cervejeiros e Maltadores (AETCM), «muito completa e aberta a todos os tipos de perfis, desde farmacêuticos a engenheiros», que o levou a descobrir que a cerveja é um produto vivo. «O malte muda todos os anos, o lúpulo também, e a levedura… a levedura é como nós, em alguns dias está mais stressada, noutros menos.» Manter o sabor inalterado, apesar dessa natureza mutável, é, segundo ele, a «magia diária» deste ofício, onde mesmo pequenos ajustes podem compensar a variação da colheita ou o comportamento inesperado da levedura.
Nesse sentido, ele explica que a individualidade de cada marca depende precisamente da sua levedura. «O incrível sabor a banana da Heineken ou o aroma a anis e maçã vermelha da Cruzcampo só podem ser obtidos graças à genética da nossa levedura. É preciso ajudá-las a criar esses aromas e, quando surgem alterações, alterar o processo para que o consumidor não note.»
E é precisamente nesta mudança de sabores que se manifesta um dos seus grandes prazeres: não se afastar de nenhum tipo de cerveja, mas saber adaptar a receita ao momento. «Depende do dia e da estação do ano», admite. «No verão, à beira da piscina, a Heineken frutada é ideal; no inverno, a Amstel Oro, mais tostada e com um sabor mais intenso, tem um sabor diferente».
Essa sazonalidade também se reflete na mesa: pratos leves e frescos, como saladas ou frango, combinam melhor com cervejas mais suaves, como a Radler; mas também há caça ou guisados de inverno, que exigem um sabor mais intenso, como a El Águila ou uma forte tostada.
A chave para esta diversidade está também no malte. Navarro explica que o tipo e a quantidade deste ingrediente determinam a cor, o corpo e a graduação alcoólica, e que «por vezes basta uma pequena alteração na quantidade utilizada na receita para que tudo mude: o malte tipo Pilsner (o mais comum) tem 4 EBC — unidade de medida europeia — de cor, enquanto o malte chocolate (que dá a cor escura da Guinness) chega a 900».
Em seguida, o mestre experimenta, combinando maltes, lúpulos e leveduras. «A Águila, por exemplo, contém uma quantidade de malte que lhe confere corpo, mas também um lúpulo chamado «lemon drop», que lhe dá um toque cítrico e herbáceo, tornando-a ideal tanto para o inverno como para o verão». Além disso, Navarro não se esquece de mencionar os seus primeiros passos nas microcervejarias Heineken em Sevilha e Málaga, onde ele e a sua equipa criavam mais de trinta receitas por ano, experimentando combinações que alimentavam o seu incansável espírito inovador.
Mas nem tudo depende da receita: também influencia a forma como a cerveja é servida e a temperatura. Para o nosso chef da cervejaria, não existe uma temperatura mágica: «A que mais lhe agradar». Embora reconheça que, em geral, a cerveja é servida a uma temperatura entre 1 e 4 graus, e as cervejas mais fortes podem ser consumidas a temperaturas mais elevadas. Ele até sugere deixar a cerveja aquecer um pouco para apreciar a sua evolução, como numa degustação. «Quanto mais fria, mais se destacam os aromas delicados, normalmente produzidos pela levedura e pelo lúpulo; à medida que a temperatura aumenta, o malte torna-se mais pronunciado». Em cervejas como a Amstel Oro ou a El Águila, esta progressão é evidente. E na Cruzcampo, segundo ele, «o aroma a maçã torna-a ideal para beber muito fria e desfrutar de toda a sua bebibilidade», um conceito com o qual ele quis expressar essa sensação de «frescura».
Como se deve beber cerveja
No entanto, existem regras de ouro: «Nunca congele a cerveja ou o copo: isso altera a estrutura, mata a espuma e dilui o sabor. E beba sempre em um copo para ver a cor e apreciar o aroma». Além disso, ele explica por que os bares costumam adicionar um pouco de água antes de servir a cerveja: «É água muito fria, que arrefece rapidamente o copo e evita que arrefeça». E se alguma vez for necessário beber da garrafa ou da lata por conveniência, «não há problema», embora ele insista que «o copo sempre dará a sensação completa da cerveja».
Quanto à combinação de temperatura e estilo, Navarro dá alguns exemplos: a imperial stout, torrada, com 9 ou 11 graus de álcool, deve ser servida a uma temperatura superior a 6 graus para revelar todos os seus matizes; a radler, pelo contrário, deve ser bebida o mais fria possível para sentir imediatamente a sua frescura. No final das contas, o objetivo é que cada cerveja se revele da melhor forma possível e que o consumidor, sem perceber, viaje por essas mudanças.
O facto é que, além das fórmulas e dos processos, Navarro destaca a capacidade da cerveja de se adaptar e se reinventar: «Nos últimos quinze anos, lançámos quase cinquenta inovações na Heineken em Espanha». Essa diversidade permite contar uma nova história e celebrar um novo momento a cada gole. «O encanto deste trabalho», sorri ele, «é que se trata de um produto que as pessoas partilham quando se sentem à vontade. E isso não tem preço».